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Fonte: Exame

Pouca gente deu importância quando um grupo de 23 cientistas dos Estados Unidos publicou um artigo na revista científica Science Translational Medicine em junho de 2017. A pesquisa descrevia pela primeira vez a ação de um novo medicamento, com o nome de GS-5734, contra doenças como a sars (síndrome respiratória aguda grave) e a mers (síndrome respiratória do Oriente Médio). O remédio, também chamado de remdesivir e criado pela farmacêutica Gilead, era estudado para o tratamento de ebola desde 2013. E os pesquisadores suspeitaram que ele poderia controlar as infecções de coronavírus.

Quase prevendo o que aconteceria em 2020, os cientistas concluíram: “Nosso trabalho fornece evidências de que o GS-5734 pode evitar que pacientes infectados por coronavírus evo­luam para uma doen­ça mais grave (…) e de que sua ação pode ser valiosa quando um novo coronavírus surgir no futuro”. O virologista Robert Jordan, um dos principais autores da pesquisa, se recorda. “Nossa motivação era a mers, porque a doença ainda estava ativa na Arábia Saudita. Mas observamos a atividade do remdesivir em diferentes coronavírus. É ótimo que isso tenha ajudado nas pesquisas da covid-19”, diz o pesquisador, que foi diretor de biologia da Gilead de 2011 a 2018.

Graças a pesquisas como essa, o remdesivir tornou-se um dos remédios de maior potencial contra a covid-19. No dia 1o de maio, a FDA, agência americana que regula o uso de medicamentos, deu autorização para que ele seja usado em caráter emergencial. Desde que o surto começou, é a primeira vez que uma droga recebe o sinal verde. A decisão foi tomada depois que surgiram novas evidências sobre o remdesivir.

Em uma pesquisa com mais de 1.000 pacientes nos Estados Unidos, o remédio reduziu o tempo médio de internação de 15 para 11 dias. A mortalidade caiu de 11% para 8%, uma diferença pequena estatisticamente. Novos estudos devem dar mais clareza. Ao todo, mais de 7.500 pacientes em 450 hospitais participam de ensaios com o medicamento. Como tudo na ciência, é possível que a conclusão seja que ele não é eficaz contra a covid-19. Num estudo com 237 pacientes em Wuhan, na China, o remdesivir não alterou a evolução da doença. Mas as notícias recentes já foram suficientes para dar esperanças. O índice Dow Jones subiu 2,2% em 29 de abril com os novos resultados sobre o remdesivir.

Enquanto uma vacina não é desenvolvida, encontrar um remédio é a maior esperança para reduzir a mortalidade e acelerar o tratamento. É uma corrida contra o relógio. O desenvolvimento de um remédio do zero pode levar até 20 anos. Por isso, boa parte das pesquisas tem se debruçado sobre drogas já existentes. São 182 medicamentos e 99 vacinas sendo estudados no mundo. A lista inclui antivirais — que, assim como o remdesivir, inibem a reprodução do vírus —, além de corticoides, antibióticos e imunomoduladores, que ajudam a equilibrar a resposta do sistema imunológico.

Esses remédios são importantes porque, na maioria dos casos, o paciente morre não por causa do vírus, mas em razão da reação agressiva das células para combatê-lo, um processo conhecido como “tempestade de citocina”. Ao todo, mais de 1.400 testes clínicos estão em andamento. “É um esforço sem precedentes”, diz James Cutrell, professor na Universidade do Texas e autor de um estudo que analisa as pesquisas de medicamentos contra a covid-19. “Os ­resultados são encorajadores, mas o remdesivir dificilmente será uma bala de prata. Precisamos identificar outras terapias.”

Um dos principais exemplos dos esforços científicos é o ensaio clínico internacional Solidarity, capitaneado pela Organização Mundial da Saúde. O estudo tem o objetivo de testar quatro remédios no tratamento de pacientes em estágio grave. Além do remdesivir, estão nesse grupo a cloroquina e a hidroxicloroquina (usadas contra a malária e outras doenças) e a combinação entre o lopinavir e o ritonavir (contra o HIV). Uma quarta vertente estuda a mesma combinação (lopinavir e ritonavir) associada ao interferon-beta, usado no tratamento de esclerose múltipla.

Com participação de França, Suíça, Espanha, Noruega, Canadá, Irã, África do Sul, Argentina e Brasil, o estudo pretende chegar a 10.000 pacientes. No Brasil, a iniciativa é liderada pelo Ministério da Saúde e pela Fiocruz e pode envolver 1.500 pacientes — por enquanto são cerca de 100. “Há muita ansiedade para encontrar uma resposta e isso leva a uma supervalorização de dados preliminares. A única forma de resposta é com um estudo clínico robusto”, diz Estevão Portela Nunes, vice-diretor do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas da Fiocruz e pesquisador principal do Solidarity no Brasil. Se tudo caminhar bem, a pesquisa da OMS deverá dar respostas mais consistentes sobre os medicamentos.

O que os cientistas estão fazendo é tentar encontrar uma molécula capaz de interferir no metabolismo do vírus. O processo se assemelha à montagem de um quebra-cabeça. A peça (a molécula) precisa se encaixar perfeitamente ao desenho (o vírus). A dificuldade é que existe um número exponencial de moléculas e princípios ativos. O uso de sistemas computacionais ajuda a reduzir o número de hipóteses.

Segundo uma pesquisa do Massachusetts Institute of Technology, a chance de um ensaio clínico de um medicamento ter sucesso é de apenas 16%. Dos 45 remédios pesquisados contra ebola, sars, mers e zika nos últimos 20 anos, nenhum mostrou ser efetivo. “Pode ser que tudo que estamos estudando agora não tenha utilidade imediata, mas será útil para uma próxima epidemia”, diz Marcus de Lacerda, médico infectologista de Manaus. Os estudos sobre o remdesivir e outros medicamentos oferecem uma esperança. Mas o sucesso de uma droga agora seria um ponto fora da curva.

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